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A crise dos opioides nos EUA já é um problema muito conhecido e, agora, ameaça o Brasil. Seria a Cannabis uma solução alternativa? Especialistas dizem que sim.
O que são os opióides?
Medicamentos opióides são substâncias derivadas da papoula do oriente, mesmo suas versões sintéticas, uma flor nativa dos campos do Sul da Europa e do Oriente Médio e também são conhecidas como dormideira-do-oriente.
Esse tipo de medicamento pode variar em sua intensidade e efeitos, mas todos possuem o mesmo objetivo clínico: anular qualquer tipo de dor física, em outras palavras um forte analgésico. Dois efeitos colaterais muito comuns nesse tipo de substância são: euforia e relaxamento, um convite e tanto para o vício.
A crise norte americana
O problema com o uso de opioides é grave e não é de hoje, os EUA enfrentam uma verdadeira guerra contra o uso abusivo de substâncias a base de ópio que se iniciou na busca de uma solução para o tratamento da dor, mas acabou tomando caminhos nebulosos ao longo de sua história.
De acordo com o jornalista Patrick Radden Keefe, autor do livro O império da dor do ano de 2021, os opióides “são a principal causa de mortes acidentais do país”. Mas como isso começou?
Para entender essa história precisamos voltar um pouquinho no tempo.
Tudo começou em meados da década de 80, quando um médico e sua assistente, ambos da Boston Collaborative Drug Surveillance Program na Universidade de medicina de Boston, publicaram um estudo com mais de 10 mil pacientes tratados com medicamentos à base de ópio. O estudo demonstrou que apenas 0,03% dos pacientes analisados apresentaram algum tipo de vício em ópio com o tratamento e levou o título de "Vício raro em pacientes tratados com opioides”.
Prato cheio para os sensacionalistas e, também, para a indústria farmacêutica que se muniu desse estudo para convencer grande parte da classe médica, se não todas, que medicamentos à base de ópio eram absolutamente seguros para diferentes tipos de dor.
O resultado foi (e ainda é) assustador. De acordo com dados do governo americano, já morreram mais pessoas do que na crise de HIV em 95 e, atualmente, o número dos dependentes de ópio ultrapassam os 2 milhões.
O problema ficou tão sério que, após uma intervenção do governo declarando emergência nacional, os pacientes encontraram uma alternativa ainda mais devastadora: a heroína. De acordo com um estudo de 2018, 80% dos usuários de heroína começaram com o uso de opióides prescritos por um médico e que, pelo menos, 29% dessas prescrições são indevidas.
Por que isso é um problema nosso?
Essa onda está chegando com força no Brasil.
A crise tupiniquim
Em 2018, um estudo publicado no American Journal of Public Health (AJPH) pelo pesquisador brasileiro Francisco Inácio Bastos, identificou um aumento alarmante no consumo de opióides em terras brasileiras: 465%!
E esse número segue crescendo, em 2021 observamos um aumento de 33% na comercialização desse tipo de substância. O que é algo inédito para nós, já que aqui no Brasil até pouco tempo atrás havia um fenômeno conhecido como “opiofobia”, um medo generalizado em médicos e pacientes em relação a esse tipo de tratamento.
Nós ainda estamos muito atrás de nossos vizinhos norte-americanos, já que a taxa de consumo da América do sul e América Central, em comparação, fica em torno dos 2%. E é também necessário entendermos que em alguns casos o uso desse tipo de medicação não só é recomendado, como necessário, é o caso de dores oncológicas, por exemplo.
Significa que não devemos nos preocupar? Claro que não.
É inegável o risco que os pacientes em todo o mundo sofrem em relação ao abuso e vício desse tipo de medicamento e a falta de opções e entendimento do mecanismo da dor podem nos fazer acreditar que só existe um caminho a ser percorrido.
E é aí que, finalmente, chegamos na Cannabis.
A Cannabis como alternativa
De acordo com um estudo recente, publicado agora em 2022 no Annals of Internal Medicine, a Cannabis pode sim ser uma alternativa viável para o tratamento de dores crônicas e ser uma aliada no combate a dependência do uso de opióides.
A pesquisadora do estudo em questão, Dra. Marian confirma que a Cannabis atinge índices de respostas comparáveis aos tratamentos mais convencionais, como os opióides, embora seus dados sejam menos robustos que os do outro grupo.
Em entrevista, a pesquisadora foi categórica: “As evidências atuais sobre os produtos relacionados com a Cannabis para a dor crônica são bem limitadas. Os pacientes com dor crônica devem consultar seus médicos para discutir quais das muitas opções para tratar a dor são melhores para começarem."
A falta de robustez nos estudos é uma questão complexa, pois muitos médicos deixam de até mesmo conversar com seus pacientes sobre o uso da Cannabis, se apoiando no que julgam ser uma falta de evidência sobre a eficácia e segurança no longo prazo para o tratamento da dor.
Estamos em 2023, é preciso se desprender do tabu em torno da Cannabis e olhar para essa substância como uma ferramenta de saúde e não só como uma droga recreativa. Milhares de pacientes ao redor do mundo se beneficiam de tratamentos à base de Cannabis, mas será que o Brasil está pronto para essa conversa?
Nós estamos.
Mikaela Alves
Referências
https://pebmed.com.br/dependencia-de-opioides-um-panorama-brasileiro/
https://www.msdmanuals.com/pt-br/casa/assuntos-especiais/drogas-recreativas-e-entorpecentes/opioides
https://www.nejm.org/doi/pdf/10.1056/NEJM198001103020221
https://www.drugabuse.gov/drug-topics/opioids/opioid-overdose-crisis
https://super.abril.com.br/especiais/o-remedio-mais-perigoso-do-mundo/
https://portal.fiocruz.br/noticia/uso-de-opiaceos-para-combater-dores-cronicas-cresce-465
https://portugues.medscape.com/verartigo/6508130?src=WNL_ptmdpls_220627_mscpedit_gen&uac=436635AZ&impID=4365179&faf=1✔️ Produto adicionado com sucesso.
